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Lições das águas

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'Terra, planeta Água'. O inspirado verso da canção de Guilherme Arantes deve cada vez mais ser objeto de reflexão.

Em janeiro, a Lei 9.443/1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH, completou sua maioridade, mas não houve qualquer celebração. Estavam todos ocupados com a crise hídrica de proporções inéditas que atinge as duas maiores regiões metropolitanas do país, São Paulo e Rio de Janeiro, bem como extensas áreas de Minas Gerais e do Nordeste. Áreas do Centro-Oeste também se encontram ameaçadas. Em declarações confusas, as autoridades parecem culpar São Pedro pela falta de planejamento e de investimentos, pela ausência de proteção dos mananciais e matas ciliares, pela incapacidade de redução das perdas na distribuição e pela inexistência de conscientização para reduzir desperdícios, entre outros graves pecados.

Considero que a Lei das Águas é adequada, realista e bem estruturada, mas a simples existência de um diploma legal não transforma a realidade. É necessário que os instrumentos de gestão nela previstos sejam implementados. Pelo visto, dezoito anos não foram suficientes.

Como se sabe, o Brasil é o maior detentor de riqueza hídrica na Terra com 11 % da água doce do planeta. Não foi a falta de chuva que provocou a atual crise hídrica e iminente crise energética no país. Foram a falta de gestão, de competência, de compromisso e de espírito público. A Califórnia tem menos chuva, mas não falta água.

Mato Grosso é um estado rico em águas, e integra tanto a Bacia Amazônica como a do Prata. Temos a beleza incomparável do Pantanal. Nosso balanço hídrico é satisfatório na quase totalidade do território.

Todavia, há motivo para preocupações. De acordo com a Agência Nacional de Águas, quase metade dos municípios mato-grossenses necessita de ampliação do sistema de abastecimento de água. O percentual de população não atendida por rede de esgoto é de 77%, mais que o dobro da média nacional. A disposição final inadequada de resíduos sólidos é de 67%, também superior ao dobro da média nacional. Por outro lado, o consumo de agrotóxicos e fertilizantes por hectare de área plantada também supera a média nacional. Os índices de desmatamento continuam elevados e as unidades de conservação não estão minimamente aparelhadas para cumprir a função de proteção dos ecossistemas. Algumas regiões como a do Alto Rio Paraguai já exibem sintomas de estresse, tanto no que concerne à disponibilidade quantitativa, como qualitativa. Os aquíferos estão ameaçados pelas mudanças no uso do solo.

É necessário atentar para os fundamentos da gestão de recursos hídricos: a água é um recurso natural limitado e um bem de domínio público,dotado de valor econômico. Assim, cumpre assegurar a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, de modo a garantir à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos.

Dos instrumentos previstos na PNRH,Mato Grosso já dispõe do Plano e do Conselho Estadual de Recursos Hídricos, bem como de vários Comitês de Bacias Hidrográficas.Contudo, ainda não existem as agências de bacia e a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, a partir do sistema de outorga dos direitos de uso.

É preciso que a gestão de recursos hídricos esteja inserida no processo de planejamento econômico regional, articulada com a gestão ambiental e a política energética. É necessária uma efetiva regulação das atividades de saneamento ambiental – abastecimento d'água, coleta e tratamento de esgotos e de resíduos sólidos – inclusive as que foram objeto de concessão. Há que se investir mais em pesquisa e monitoramento. É primordial a articulação de órgãos municipais e estaduais, associações representativas de produtores e de comunidades, universidades e demais interessados.

Para evitar que crise semelhante à atual atinja nosso estado, é preciso aprender com as lições das águas.

Luiz Henrique Lima – auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT. Graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia.

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